Nova York, 1º de Setembro de 2000

‘Bom, acho que é aqui que nos separamos’ Falei respirando fundo, diante do imponente Rose Building, minha nova morada durante um ano.

‘Se você precisar de alguma coisa, qualquer coisa, não hesite em me chamar’

‘Vou ficar bem’ Sorri de leve e ele relaxou um pouco. Sabia o quanto tinha o deixado aflito nos últimos dias e agora fazia de tudo para não preocupá-lo ‘Dario e Georgia estão aqui, não vou estar sozinha’

‘A gente se vê sexta-feira’ Micah acenou para os dois mais atrás de mim e me beijou ‘Boa sorte’

‘Pra vocês também’

Ele sorriu uma última vez e desaparatou, me deixando sozinha pela primeira vez em semanas. Respirei fundo mais uma vez e caminhei até meu primo e Georgia, e entramos os três juntos no edifício. Os 12 últimos andares do Rose Building abrigavam os dormitórios da Escola Juilliard e quando chegamos ao primeiro dos 12 andares, encontramos o restante da turma de calouros já reunida, fomos os últimos a chegar. O primeiro andar parecia ser uma área comum a todos os alunos, com televisão, cozinha, lavanderia e algumas máquinas com lanches rápidos.

‘Bom dia, calouros’ Uma voz animada chamou a atenção de todos ‘Meu nome é Stacy Freeman, sou a monitora responsável pelo tour desse ano. Como todos já perceberam, essa é a nossa sala comunal, onde os alunos costumam relaxar nos finais de semana ou depois de um dia exaustivo de aulas. Agora me acompanhem, vou mostrar os demais andares antes da aula inaugural’

A monitora chamada Stacy começou a andar pelos corredores, usando as escadas no lugar dos elevadores para guiar a nova turma de alunos. Enquanto passávamos pelo restante dos 12 andares, ela apresentava alguns dos veteranos que encontrava pelos corredores e explicava o que íamos encontrar em cada um dos andares, além dos dormitórios. A turma olhava a tudo com fascinação. Sonhava com o dia que entraria para a mesma escola que minha mãe se formou desde que era criança, mas agora que o dia havia chegado, parecia ser um sonho do qual eu despertaria muito em breve.

‘Agora que já apresentei todos os nossos andares, vocês terão meia hora para conferirem se todos os seus pertences já estão nos dormitórios que estão marcados em suas cartas e depois sigam para o nosso auditório, que fica localizado no primeiro andar do edifício’ Ela olhou para os calouros sorrindo animada ‘Bem vindos a Juilliard!’

‘Vou checar com quem estou dividindo o quarto, encontro vocês daqui a pouco’ Dario se despediu e desceu as escadas apressado.

‘Bom, segundo a carta que recebi, meu dormitório fica no andar debaixo’ Falei enquanto consultava o papel em minha mão.

‘O meu também, mas vou tirar uma dúvida com aquela menina, encontro você depois’ Georgia também se despediu e sumiu entre os alunos que procuravam seus quartos.

Acabei descendo sozinha até o andar onde estava localizado meu quarto. Era a segunda porta do longo corredor, logo depois de passar por uma pequena sala com sofás, uma televisão e dois computadores. A porta ainda estava fechada, o que indicava que minha nova companheira de quarto ainda não havia encontrado o local. O quarto era todo branco e tinha uma cama de cada lado, com um criado-mudo para cada uma delas. Tinha uma mesa de estudos com algumas prateleiras vazias e nenhum tipo de decoração, que deveria ficar a critério dos novos moradores. Escolhi logo a cama mais afastada da porta e sentei devagar, alisando o colchão enquanto observava cada canto do novo quarto.

‘Ei, companheira de quarto!’ Ouvi uma batida na porta e quando olhei, Georgia estava parada nela ‘Meio pálido esse quarto, mas acho que só precisaremos de um dia para deixá-lo com a nossa casa’

‘O que está fazendo aqui?’ Perguntei espantada.

‘Esse não é o quarto 2102?’ Georgia consultou o papel em sua mão ‘Diz aqui que é o meu quarto’

‘Dançarinos podem dividir o quarto com músicos e atores’ Repeti o que havia lido no folheto explicativo, incrédula.

‘Acho que o destino quer que a gente mantenha a amizade’ Georgia sorriu animada, ocupando a cama que havia sobrado.

‘Não precisa se preocupar, Georgia’ Acabei rindo, ainda sem acreditar que passaria um ano dormindo no mesmo quarto que ela ‘Não estava planejando fugir de você’

‘Ei, olhe só isso, caíram no mesmo quarto’ Dario entrou no quarto ao lado de um garoto de cabelos ruivos e espetados ‘Esse é o Ephram, ele é músico e está dividindo o quarto comigo’ O garoto entrou no quarto também, sorrindo um pouco sem jeito ‘Essas são Georgia e Evie, minha prima’

‘Muito prazer, Ephram’ Georgia levantou animada e apertou a mão do menino com entusiasmo.

‘Ainda é difícil de acreditar que estamos aqui’ Dario falou sorrindo eufórico.

Caminhei até a janela e pela primeira vez pude contemplar a vista que tinha da cidade de Nova York do alto do Rose Building. Dario tinha razão: era difícil de acreditar, mas estávamos mesmo em Juilliard.

ººººº

‘Ah, finalmente!’

Shannon exclamou impaciente quando aparatei na sua frente, depois de deixar Evie em frente ao prédio da Juilliard. Estávamos no bairro do Soho, diante de um prédio de aparência muito antiga. Ele tinha 4 andares e ocupava quase meio quarteirão. Era o prédio da Academia de Aurores de Nova York. Consultei o relógio e vi que já estávamos quase atrasados para a apresentação dos calouros.

‘Melhor entrarmos, não quero começar já me atrasando’ Shannon abriu a porta e o silencio da rua foi tomado por um falatório sem fim que vinha lá de dentro ‘E pelo visto, somos os últimos...’

Shannon tinha razão. Quando passamos pelo hall de entrada da Academia, todos os olhares se voltaram para nós dois, pois éramos os únicos calouros que faltavam na fila formada no centro do enorme hall. Apressamos-nos em nos juntarmos ao restante da turma e não pude deixar de notar que Shannon atraia muito mais olhares, não só da nossa turma como também de muitos veteranos. Ao me posicionar em meu lugar na fila, notei que em todo o hall, só tinha ela e mais uma garota, que também atraia muitos olhares e cochichos.

‘Atenção!’ Um garoto corpulento que devia ter seus 20 anos gritou enérgico ‘Todos em forma!’

Nossa turma continuou parada, sem saber o que fazer, mas ao ver todos os outros alunos da Academia ficarem eretos em posição militar logo percebemos que deveríamos fazer o mesmo. Um homem com uma roupa que mais parecia uma farda veio caminhando entre a fila formada por veteranos e parou na nossa frente.

‘Descansar’ Com uma única palavra sua, os demais alunos trocaram de posição para algo que deveria ser mais relaxado, mas no meu ponto de vista estava longe disso ‘Bem vindos a Academia de Aurores de Nova York, cadetes. Hoje é o começo dos três mais difíceis e sacrificantes anos de suas vidas, mas que valerão à pena. Nossa Academia é conhecida por ter o treinamento mais intenso, com métodos radicais que nos diferem das demais e nos destacam como a Academia que forma os Aurores mais astutos e bem preparados para enfrentar qualquer tipo de situação, seja ela trouxa ou bruxa’ Ele fez uma breve pausa e alguns veteranos rapidamente distribuíram um pequeno livro dentro de uma capa plástica, com uma corda para pendurarmos no pescoço ‘Durante seu primeiro ano aqui, vocês deverão andar com o manual da nossa Academia pendurado no pescoço. É o que irá diferenciá-los dos demais cadetes. O livro deve ser lido e decorado, perguntas sobre ele serão feitas a qualquer minuto e se não as responderem corretamente, serão punidos. Vocês irão encontrar tudo que precisam saber sobre a nossa instituição nele. Como nossos cadetes veteranos já perceberam, pela primeira vez, esse ano contamos com a presença de duas mulheres. Nossa Academia tem a tradição de formar apenas homens por ser a mais puxada, mas as cadetes Austen e Aldrin são bem vindas. Tanto o dormitório quanto o banheiro que será usado por ambas não podem ser abertos por magia, apenas por uma chave’

‘É melhor trancar mesmo’ Ouvi um garoto cochichar atrás de mim e outro rir.

‘Tem algo a dizer, cadete Barnett?’ O veterano que abriu passagem para o comandante gritou no ouvido dele.

‘Não’ Mesmo sem olhar para trás, podia sentir o garoto tremer. Não pude evitar um sorriso debochado.

‘Quando um superior lhe fizer uma pergunta, cadete cabeçudo, a resposta é “senhor, não senhor” e “senhor, sim senhor”!’ Ele gritou outra vez e ninguém sequer se movia na fila ‘FUI CLARO?’

‘Senhor, sim senhor!’ O garoto de sobrenome Barnett respondeu com a voz um pouco falha.

‘Assim está melhor’ O veterano se afastou do nosso grupo e voltou para o lado do comandante ‘Porque o cadete homem que for pego dentro do banheiro feminino será severamente punido e poderá ser expulso da Academia, se tiver uma ficha de punições acima de 5 deméritos’

‘Minha parte aqui terminou. Agora nossos veteranos cuidarão de vocês’ O comandante analisou calmamente cada uma das pessoas naquela fila com uma expressão intimidadora ‘Bem vindos a Academia de Aurores’

Os veteranos se colocaram em posição de sentido outra vez para deixá-lo passar e assim que o homem saiu do hall, todos avançaram para cima da gente, gritando ordens para fazermos flexões ou mesmo insultos aleatórios, que deveríamos ouvir calados e sem revidar, afinal, ninguém ia querer comprar briga com um veterano logo no primeiro dia. Sabia que não seria nada fácil sobreviver naquele lugar, mas nada me faria desistir. Meu sonho estava começando e por mais difícil que fosse conquistá-lo, eu ia conseguir.